A decisão da semifinal do campeonato brasileiro de 1995 faz aniversário nesse dia 10 de dezembro. Não foi, definitivamente, uma partida comum. A goleada alvinegra teve como destaque Giovanni, o Messias, que trouxe de volta o sorriso e um futebol de gala para o torcedor
Era um domingo, e o horário pouco trivial para uma semifinal de campeonato brasileiro. A partida teve início às 19h, e, para variar, quem implantou o novo horário para jogos de futebol aos domingos havia sido a Globo, à época preocupada com as constantes derrotas do Domingão do Faustão para o Programa do Gugu, no SBT. O palco não era a Vila Belmiro, mas um Pacaembu lotado de santistas que acreditavam em um milagre.
Sim, o Peixe havia perdido a partida de ida para o Fluminense, no Maracanã, por 4 a 1, e o time carioca era uma das defesas mais sólidas do futebol brasileiro naquele ano. Lembro de jogar bola na praia do Itararé, em São Vicente, à tarde, e um amigo corintiano dizer que o técnico Cabralzinho havia enterrado as chances alvinegras naquele jogo, por tentar manter uma formação ofensiva em vez de segurar a derrota pelo placar mínimo. Disse preferir perder assim, buscando a vitória, e completei dizendo que o Santos não estava eliminado ainda. Ele riu e perguntou: “Você acha que vão ganhar por três gols de diferença?”.
Sim, eu achava, mas não era só eu. Aquele time tinha desenvolvido um futebol ofensivo, brilhante, no segundo turno do Brasileiro e com um craque que honrava a camisa dez sagrada do Santos. Giovanni comandava a equipe que contava com Jamelli, Macedo, Vágner, Robert, Narciso, Carlinho, Camanducaia, Edinho e outros que devolveram a esperança e a auto-estima à nação santista. Sim, era possível. E a história foi escrita com muita emoção, mas também com uma vontade incrível de cada um dos jogadores daquele time. E com um talento sobrenatural do Dez alvinegro.
Não é à toa que aquela partida ficou na memória dos santistas, talvez como a maior que o Peixe fez nos últimos vinte ou trinta anos. O site do Globo Esporte vai transmitir a íntegra a partir das 15h desta quinta-feira, mas você pode conferir os melhores momentos abaixo. Segue também um texto adaptado de um original já publicado no blogue sobre o duelo antológico.
Semifinais do Brasileiro de 1995 – Santos 5 X 2 Fluminense
Naquele dia vi uma das partidas mais memoráveis da história recente do futebol brasileiro. E, para mim, a maior atuação de um jogador de futebol que testemunhei com a camisa 10 que foi de Pelé.
Era um domingo, 10 de dezembro de 1995. Já havia visto in loco na Vila Belmiro o Santos vencer o Corinthians por 3 a 0 e, no meio da semana; e superar o Palmeiras de Luxemburgo, no Pacaembu, por 1 a 0, com um golaço de Wagner. Esses resultados consolidariam a arrancada alvinegra rumo às semifinais do Brasileiro daquele ano. Eram 24 times divididos em dois grupos e todos jogavam contra todos, classificando-se os campeões de cada grupo no primeiro e segundo turno.
Mas, daquela vez, teria que me contentar em assistir à partida pela televisão. Era o segundo jogo da semifinal entre Santos e Fluminense. No primeiro, no Maracanã, o Peixe perdia por 2 a 1 até os 40 minutos quando, no final, levou dois gols do time carioca, terminando a partida com dois jogadores a menos (Robert e Jamelli foram expulsos). Precisaria devolver a diferença de três gols na volta para chegar à final.
A missão parecia impossível. Nenhuma equipe havia descontado uma vantagem como essa na história do Brasileirão e, nos confrontos entre os dois times até então na competição, jamais o Alvinegro havia vencido o Tricolor por mais de um gol de diferença. Além disso, o Fluminense tinha a melhor defesa do campeonato (17 gols em 23 partidas) e o campeão do Rio (com o gol de barriga de Renato Gaúcho) não perdia por tal diferença no campeonato há 28 jogos. Mas o Santos contava com Giovanni, o 10 chamado de Messias pela torcida, e que, naquele dia, de fato concretizou um milagre.
E quem deu início à histórica jornada foi o lépido atacante Camanducaia, que driblou pela esquerda do ataque e sofreu pênalti. Giovanni, sereno, cobrou e, ato contínuo, foi até o fundo da rede buscar a bola e levá-la até o meio de campo. Sabia que era preciso fazer mais. Ainda na primeira etapa, o dez recebe do meia Carlinhos, finta Alê e chuta, de bico. Novamente, vai até o fundo do gol e resgata a bola. Parecia mais que obstinado. Aparentava estar possesso.
No intervalo, o show continuava. O time não desceu para os vestiários, o técnico Cabralzinho preferiu que os atletas sentissem o calor da torcida que lotava o Pacaembu. E, aos 6 minutos, o time retribui a força dos torcedores. Giovanni toca para Macedo, que se livra da marcação e faz com a canhota. O Santos atingia seu objetivo, mas a alegria não durou um minuto. Na seqüência, Rogerinho empatou para o Fluminense e o time carioca voltava a ter uma vaga na final.
De novo, Giovanni teve que intervir. O zagueiro Alê não sabia se atrasava a bola ou saía jogando e o craque santista deu o bote, roubando a bola que, na dividida entre os dois e o goleiro Wellerson, sobrou para Camanducaia fazer o quarto. De novo, o Alvinegro estava na final. Mas o zagueiro Ronaldo Marconato acabou expulso e o time, com um a menos, se retraiu, dando calafrios na torcida.
Foi quando bola chegou no meio de campo para… bom, nem precisa dizer para quem chegou a bola. Havia dois jogadores do Fluminense marcando em cima e mais um à espreita. O Dez conseguiu, com um passe antológico de calcanhar, achar Marcelo Passos, que avançou até a entrada da grande área, limpou Vampeta e chutou no canto esquerdo de Wellerson. Segundo Odir Cunha em seu Time dos Céus, o lance, que ocorreu quase em frente ao técnico tricolor Joel Santana, fez com que o mesmo exclamasse: “Pqp… como joga esse cara!”.
5 a 1, o torcedor do Santos podia respirar mais aliviado. Ou melhor, nem tanto. Em seguida, Rogerinho de novo desconta para a equipe do Rio. Mas não dava mais tempo. Um espetáculo fabuloso, com belos lances e todo o requinte de drama. Isso sem contar a torcida que jogou junto o tempo todo, tanto que Renato Gaúcho, ao desembarcar no Rio, declarou, conforme relato de Cunha: “Nunca tinha sentido tanta pressão da torcida jogando no Brasil. Era como se estivesse na Bombonera enfrentando o Boca Juniors em uma decisão.”
Uma classificação heróica, um jogo que entrou para a História e um craque que não deixava dúvidas. E que me desculpem Pita – que vi atuar quando moleque -, Diego ou Zé Roberto, mas Giovanni foi o maior camisa 10 que testemunhei jogar no Santos.
Técnico: Cabralzinho
Técnico: Joel Santana